Tenho aprendido com o tempo que a felicidade vibra na frequência das
coisas mais simples. Que o que amacia a vida, acende o riso, convida a
alma para brincar, são essas imensas coisas pequeninas bordadas com
fios de luz no tecido áspero do cotidiano. Com o toque bom do sol
quando pousa na pele. A solidão que é encontro. O café da manhã com pão
quentinho e sonho compartilhado. A lua quando o olhar é grande. A
doçura contente de um cafuné sem pressa. O trabalho que nos erotiza. Os
instantes que repousamos os olhos em olhos amados. O poema que parece
que fomos nós que escrevemos. A força da areia molhada sob os pés
descalços. O sono relaxado que põe tudo para dormir. A presença da
intimidade legítima. A música que nos faz subir de oitava. A delicadeza
desenhada de improviso. O banho bom que reinventa o corpo. O cheiro de
terra. O cheiro de chuva. O cheiro do tempero de feijão da infância. O
cheiro de quem se gosta. O acorde daquela risada que acorda tudo na
gente. Essas coisas. Outras coisas. Todas, simples assim.
Tenho aprendido com o tempo que a mediocridade é um pântano habitado
por medos famintos, ávidos por devorar o brilho dos olhos e a
singularidade da alma. Que grande parte daquilo que juramos acreditar
pode ser somente crença alheia que a gente não passou a limpo. Que pode
haver alguma conforto no acordo tácito da hipocrisia, mas ele não faz a
vida cantar. Que se não tivermos um olhar atento e generoso para os
nossos sentimentos, podemos passar uma jornada inteira sem entrar em
contato com o que realmente nos importa. Que aquilo que, de fato, nos
importa, pode não importar a mais ninguém e isso não tem importância
alguma. Que enquanto não nos conhecemos pelo menos um pouquinho,
rabiscaremos cadernos e cadernos sem escrever coisa alguma que tenha
significado para nós.
Tenho aprendido com o tempo que quando julgamos falamos mais de nós do
que do outro. Que a maledicência acontece quando o coração está com mau
hálito. Que o respeito é virtude das almas elegantes. Que a empatia
nasce do contato íntimo com as nuances da nossa própria humanidade. Que
entre o que o outro diz e o que ouvimos existem pontes ou abismos,
construídos ou cavados pela história que é dele e pela história que é
nossa. Que o egoísmo fala quando o medo abafa a voz do amor. Que a
carência se revela quando a auto-estima está machucada. Que a culpa é
um veneno corrosivo que geralmente as pessoas não gostam de ingerir
sozinhas. Que a sala de aula é a experiência particular e
intransferível de cada um.
Tenho aprendido com o tempo coisas que somente com o tempo a gente
começa a aprender. Que o encontro amoroso, para ser saudável, não deve
implicar subtração: deve ser soma. Que há que se ter metas claras, mas,
paradoxalmente, como alguém me disse um dia, liberdade é não esperar
coisa alguma. Que a espontaneidade e a admiração são os adubos naturais
que fazem as relações florescerem. Que olhar para o nosso medo,
conversar com ele, enchê-lo de cuidado amoroso quando ele nos incomoda
mais, levá-lo para passear e pegar sol, é um caminho bacana para evitar
que ele nos contraia a alma. Tenho aprendido que se nos olharmos mais
nos olhos uns dos outros do que temos feito, talvez possamos nos
compreender melhor, sem precisar de muitas palavras. Que uma coisa vale
para todo mundo: apesar do que os gestos às vezes possam aparentar
dizer, cada pessoa, com mais ou menos embaraço, carrega consigo um
profundo anseio por amor. E, possivelmente, andará em círculo, cruzará
desertos, experimentará fomes, elegerá algozes, posará de vítima para
várias fotos, pulará de uma ilusão a outra, brincará de esconde-esconde
com a vida, até descobrir onde o tempo todo ele está.